Artistas culturais das favelas aguardam auxílio da lei de emergência cultural

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“A lei é maravilhosa, mas a demora é desumana”. O desabafo é da atriz e professora de teatro, Dione Prado, produtora cultural há 30 anos. O descontentamento já dura quatro meses, tempo em que o auxílio financeiro da Lei de Emergência Cultural – batizada de Lei Aldir Blanc – foi aprovada no Senado e sancionada por Jair Bolsonaro em agosto. Milhares de artistas e produtores culturais nas favelas do Rio ainda não sabem quando vão receber o benefício através da Prefeitura do Rio. Regulamentada em 18 de agosto, esta lei garante o repasse de R$ 39 milhões à cidade do Rio. 

O recurso ainda não foi repassado ao município, o que aumenta o drama dos profissionais que serão os últimos a retornar com os trabalhos.  No entanto, à partir desta segunda-feira (14), cinemas, teatros e anfiteatros estão liberados para funcionarem, mas com restrições, como atuar apenas com 50% da capacidade, assentos numerados e proibido o consumo de bebidas e comidas.

A flexibilização das atividades culturais no morro

Na Rocinha, favela com mais de 80 ações culturais registradas no Mapa Cultural da Rocinha, a flexibilização não resolve a situação à curto prazo. Espaços culturais que antes recebiam diversas atrações, continuam sem funcionamento e sem prazo para reabertura. 

É o caso do anfiteatro do Parque Ecológico da Rocinha, no Portão Vermelho. A secretária teatral, Renata Simões, mantém as esperanças sobre o espaço que recebia apresentações de peças teatrais, aulas de dança, capoeira e educação comunitária. “Eu gostei muito da lei, mas estou tentando entender como ela vai alcançar os artistas da comunidade. Eu recebi informações, mas não recebi nenhuma confirmação de repasse, quais serão os requisitos e se vou me enquadrar”, conta Renata Simões, que representa cerca de 400 fazedores de cultura no morro.

Anfiteatro do Parque Ecológico da Rocinha vinha sendo usado por artistas culturais. Foto: De Tudo Um Pouco/2014

Dione Prado, que possui outros trabalhos fora da área cultural, ressalta que não é apenas o artista da favela que está passando por dificuldades, chamando a atenção para as outras possibilidades também. “Eu penso que essa lei Aldir Blanc ela já deveria ter sido aceita com máxima urgência, assim como foi o auxílio emergencial, porque a fome não espera. Eu posso dizer com toda a certeza desse mundo, tem artista vendendo suas coisas de dentro de casa para comer, e isso é muito sério”, enfatiza a atriz.

Após 28 anos, a Via Sacra da Rocinha, realizada por dezenas de artistas locais, não foi encenada por causa do coronavírus. O diretor da peça, Robson Melo, mostrou desânimo com a lentidão na transferência de renda. “Os políticos não deixam o dinheiro chegar nas mãos dos artistas. O repasse está na fase de cadastro, é complicado porque é uma burocracia muito grande. É proposital que esse dinheiro não chegue. Além de não ter chegado, já querem reabrir os teatros e cinemas”, lamenta ele.

Cadastro municipal

A Secretaria Municipal de Cultural criou o Cadastro Municipal de Cultura, que faz o mapeamento de profissionais, espaços, grupos, instituições e coletivos que integram a cadeia produtiva da Cultura no Município do Rio de Janeiro. As inscrições encerraram no início de setembro.

Segundo a secretaria, mais de 14 mil cadastros foram realizados, sendo 6.196 de artistas individuais e 8.158 de espaços, grupos e coletivos. “A inscrição é fundamental para que os profissionais do setor cultural recebam o auxílio da lei de emergência cultural”, disse a pasta. As inscrições aconteceram por meio de um formulário online que alimentará o Mapa Cultural do município. A previsão é que os repasses sejam feitos ainda em setembro.

“Essa é uma demanda histórica dos produtores e fazedores de cultura do Rio de Janeiro junto à secretaria e ao Conselho Municipal de Política Cultural, e para nós é muito gratificante realizar isso”, diz o coordenador de Fomento da secretaria Municipal de Cultura, Carlos Janan.    

A secretaria também está fazendo plantões presenciais para informar sobre as chamadas públicas e editais. 11 equipamentos da rede municipal foram selecionados para a atividade. Os mais próximos à Rocinha são os da Cidade das Artes, na Barra da Tijuca, e a Biblioteca Machado de Assis, em Botafogo. Na Rocinha, a Biblioteca Parque C4 permanece fechada há meses e não foi escolhida para ser um ponto de plantão presencial. Atualmente, o espaço é administrado pela Secretaria Estadual de Cultura.

*Alberto Martins, correspondente local sob supervisão de Michel Silva no programa de microbolsas do Fala Roça, em parceria com Repórteres Sem Fronteiras – Brasil

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