
Como a Rocinha inspirou a nova campanha da Rabanne
CONTEÚDO DE MARCA
Do primeiro raio de sol ao último grave da madrugada, a nova campanha da Rabanne, batizada de Sunset to Sunrise, mergulha na potência sensível dos bailes da Rocinha e transforma o funk carioca em linguagem de moda global. A marca, conhecida por sua ousadia estética, volta seus olhos e seus ouvidos para a batida que molda o cotidiano e os sonhos de milhões de jovens no Rio de Janeiro. Mas desta vez, o que pulsa por trás das câmeras também ganha protagonismo.
Sob direção do francês Emmanuel Cossu e fotografia da artista visual Melissa de Oliveira, nascida e criada no Morro do Dendê, a campanha é mais do que um olhar sobre o funk: é uma construção feita com o funk. Com mais de 70 pessoas envolvidas diretamente no set, Sunset to Sunrise apostou em uma equipe diversa, conectada ao território e à cena que a inspirou. Foram 20 bailarinos de movimentos como o passinho, incluindo nomes como Hiltinho Fantástico e o coletivo Oz Crias, DJs e artistas como Guiguinho, Aisha e Yaminah Mello, e 50 talentos dos próprios bailes da Rocinha, muitos deles sem trajetória profissional, mas donos de uma presença única, carregada de estilo, potência e verdade.
O Fala Roça já mostrou que as lajes, quadras e becos da Rocinha se tornaram cenário para videoclipes e sessões de fotos de artistas de diferentes gêneros musicais. Do funk ao rap, do samba ao pagode, passando até pelo gospel, o morro virou palco. Os espaços da favela ajudam a dar forma à cena cultural carioca, seja para quem está começando agora ou para nomes já consagrados na música. A campanha da Rabanne se insere nesse contexto, somando-se a uma história de ocupação criativa que parte da favela para o mundo.

A diretora criativa da campanha, Mari Stockler, tem uma trajetória longa com o funk. Ela lançou o livro Meninas do Brasil em 2001, mas as fotos que compõem a obra foram feitas cerca de sete anos antes, em bailes funk. “Sempre tive muito interesse pelo tema. Também fui muito próxima do Hermano Vianna, autor de O Mundo Funk Carioca. Essa é uma cultura que pesquiso e acompanho há muito tempo, com muito respeito e admiração”, conta.
“Quando surgiu a oportunidade dessa campanha, falei imediatamente da Melissa de Oliveira, uma fotógrafa jovem que admiro muito. Ela é do Morro do Dendê, tem um trabalho incrível como artista visual e vai além da fotografia tradicional. A ideia era justamente essa: criar junto com a Rabanne. A marca já tem uma história ligada à cultura negra e da musica. Foi uma das primeiras a colocar modelos negras nas passarelas, assim como a colocar o hip hop como tema dos desfiles, com Paco Rabanne, seu fundador.
Ao reconhecer a estética dos bailes como uma expressão legítima de criatividade contemporânea, a Rabanne entendeu que não era possível contá-la sem trazer para dentro da campanha os protagonistas dessa história. Com isso, rompe-se mesmo que discretamente uma lógica ainda comum no mercado de moda de luxo, onde referências periféricas são frequentemente filtradas por olhares externos. Aqui, o território participa ativamente da criação, com impacto direto na economia criativa local.
No figurino, Flavia Lafer assina o styling com colaboração de Claudia Kopke e Marina Franco. A trilha sonora mescla clássicos do funk com bossa nova, de MC Neguinho a Luiz Bonfá, criando uma ponte sonora entre o morro e o mundo. E tudo isso embalado pela dança, pela estética e pela energia que só os bailes produzem, um espaço de reinvenção constante, onde cada batida é uma afirmação de existência.
O filme de moda é, antes de tudo, uma narrativa coletiva. Melissa de Oliveira, que assina a direção de fotografia, trouxe para a lente a linguagem silenciosa do cabelo, do gesto e da vestimenta das ruas cariocas. Sua visão amplia a ideia de beleza: em vez de traduzir, ela revela. “Acho que o que mais me toca nesta campanha é poder apresentar a favela como referência do que é moda, do que é estilo e do que é elegância. Sempre tentei expressar isso no meu próprio trabalho, como o cotidiano na favela reflete beleza e até mesmo uma espécie de futurismo.”
Sunset to Sunrise aponta um caminho possível. Um caminho em que a cadeia criativa se expande, inclui e remunera quem, por tanto tempo, foi fonte de inspiração. Um caminho onde o brilho da favela não é apenas estética: é construção, presença, trabalho. De fato, o som do baile nunca esteve tão alto. E, desta vez, quem fez a batida também está no holofote.