Olhos que falam

Você já olhou nos olhos de uma mulher da favela? Mas olhou de verdade — não só para ver, mas para enxergar. Enxergar o tempo que ela carrega nas costas, as memórias bordadas no silêncio, as dores disfarçadas de força e os sonhos, ainda vivos, que insistem em brilhar.

Nesta edição, no mês de março, escolhemos seguir os olhos das mulheres. Como no livro de Conceição Evaristo, que se pergunta, com angústia, a cor dos olhos da mãe, também nos perguntamos: o que temos visto nos olhos das mulheres da Rocinha?

Esses olhos são rios profundos — olhos d’água que choram, mas também navegam. Neles cabem histórias de luta, de criação, de sobrevivência e de invenção da vida onde a cidade muitas vezes falha. São olhos que escrevem com a força da palavra, da escuta, da denúncia, da sensibilidade.

O Fala Roça, em seus 12 anos, tem as digitais e os olhares de muitas mulheres. Mulheres que pautaram, escreveram, editaram, distribuíram e acreditaram. Mulheres que olham para a favela com afeto, coragem e urgência.

A capa desta edição é uma reverência. No centro, Carolina Maria de Jesus — mulher preta, favelada, escritora, visionária. Ao seu redor, as vozes que ela abriu caminho para ecoar: Karen Fontoura, juventude e jornalismo. Malu Vibe, juventude e arte urbana. Dona Jô, a força do cotidiano, base dos sonhos. Maria das Dores, que luta por saneamento e mobiliza com teatro. Maria Eunice, religiosidade de matriz africana e amor LGBTQIAPN+. Márcia Ferreira, que planta educação e molda gerações desde a infância.

Este jornal é dedicado a elas. Às que vieram antes, às que estão agora e às que estão por vir. Que essa edição seja um espelho d’água, onde cada leitora e leitor possa ver refletido o rosto de uma mulher que transforma, comunica e resiste. E que a gente nunca mais se esqueça: os olhos das mulheres da favela têm cor de coragem. Cor do futuro.

Boa leitura!