Em 3 dias, 50% de pacientes de clínica particular testam positivo para Covid-19 na Rocinha

Testes positivos de Covid-19 em clínica particular na Rocinha contrariam dados públicos
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A Rocinha lidera a lista de casos do novo coronavírus em favelas do Rio de Janeiro. Até o dia 14/04, eram 35 casos confirmados da doença na favela. Há indícios de que esse número seja ainda maior do que indicam os painéis oficiais de monitoramento da Covid-19. 

Não há testes disponíveis nas unidades públicas de saúde no interior do morro para casos leves. Os moradores com melhores condições financeiras ou os que ganharam a oportunidade gratuita através de um projeto social, estão recorrendo a uma clínica particular, o Centro de Medicina Integrada da Rocinha (CMIR), que está realizando testes rápidos para diagnóstico da Covid-19.

Segundo o projeto, 21 moradores  fizeram o teste rápido entre os dias 11 e 14 de abril. Dez pacientes, ou seja, quase 50% dos que realizaram os exames, tiveram resultado positivo para o vírus. No mesmo período, o Painel Rio Covid-19 contabilizou apenas 2 novos casos confirmados do coronavírus na Rocinha.

Nesta terça-feira (14), o boletim da Prefeitura atualizou os dados para a Rocinha: são 35 casos confirmados, 3 óbitos e 3 pacientes recuperados. A evolução do número de casos confirmados pode ser analisada no Painel Rocinha Covid-19, atualizado todos os dias pelo Fala Roça com base nos dados da prefeitura.

No sistema público de saúde, muitos pacientes com sintomas de covid-19 são medicados, orientados a retornar para casa e se isolar dos demais parentes. O temor é de que esteja ocorrendo a subnotificação de casos suspeitos na Rocinha. O Ministério da Saúde reconheceu durante uma coletiva de imprensa em março deste ano que há uma subnotificação importante de casos graves no sistema, mas afirmou que a responsabilidade é dos hospitais e unidades de saúde que recebem esses pacientes.

Conflito de dados públicos

No Rio de Janeiro, os dados divulgados no Painel Rio Covid-19 são alimentados pelo Centro de Informação Estratégica de Vigilância em Saúde (CEVIS), da Secretaria Municipal de Saúde com base nos dados reportados pelo CIEVS da Secretaria Estadual de Saúde do Rio de Janeiro. As clínicas particulares que realizam testes rápidos no país possuem acesso a um sistema eletrônico vinculado ao DATASUS, do Ministério da Saúde.

Porém, o ministério não repassa os dados de clínicas particulares para governos estaduais e prefeituras, informou a assessoria de imprensa. Pelo contrário, os dados de clínicas particulares vão para o município, depois encaminham para o Estado e, por último, são enviados para o governo federal.

Outro ponto de atenção relacionado aos dados de casos confirmados, óbitos e recuperados são as inconsistências entre os dados divulgados pelo Ministério da Saúde e pelos órgãos estadual e municipal. No dia 7 de abril, o governo do Rio afirmou que 6 moradores tinham morrido por Covid-19. A informação foi corrigida na madrugada do dia seguinte. Horas depois, o prefeito Marcelo Crivella declarou que duas pessoas morreram na Rocinha com o novo coronavírus. 

Além disso, dias atrás, o número de pessoas recuperadas da doença estava alternando entre 2 e 0, segundo o painel da prefeitura. Num dia afirmavam que 2 moradores estavam recuperados do vírus. Dias depois atualizaram dizendo que ninguém se recuperou.

Teste grátis no morro

O teste rápido realizado pela clínica particular na Rocinha possui registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) conforme consta no site do órgão federal. Apenas 24 produtos receberam autorização para serem comercializados no Brasil. 

No caso dos moradores que ganharam a oportunidade gratuita de fazerem os testes rápidos, a iniciativa é do projeto Favela Sem Corona. A organização realiza a compra de testes rápidos de Covid-19 da clínica na Rocinha e equipamentos de proteção, que são doados a organizações de saúde. 

O projeto foi criado com o objetivo de diminuir o impacto da epidemia de coronavírus nas favelas do município, atuando nas áreas de prevenção e apoio ao diagnóstico. O recurso vem de campanhas de doações que o projeto está organizando. 

Moradores interessados podem preencher um formulário online. Nesta primeira etapa da campanha, os testes rápidos são destinados à pessoas do grupo de risco, que tiveram contato com casos fatais ou confirmados. 50 testes foram comprados até o momento, ao custo aproximado de R$ 12.500,00. Uma quantidade baixa se comparado com a população da Rocinha que gira em torno de 120 mil pessoas.

Na estação Seoul Station, na Coréia do Sul, os trens KTX passam por desinfecção para COVID-19. Foto: Kim sun joo

Para Pedro Berto, idealizador do Favela Sem Corona, o Estado precisa fazer o teste massivo para enfrentar o novo coronavírus, seguindo os moldes da estratégia muito bem sucedida montada pela Coreia do Sul. O país asiático realiza 15 mil testes por dia, incluindo o grupo dos assintomáticos por ser um dos importantes disseminadores da doença. Se testarem positivo, as pessoas são isoladas de outras e parentes são rastreados por autoridades de saúde. Junto com o distanciamento social voluntário, o país desacelerou a expansão da pandemia e achatou a curva.

Testar toda a população da Rocinha custaria, em média, R$ 30 milhões. “Se o Estado tivesse testando a população da favela teria noção do problema que vamos enfrentar, e eu estaria abraçando outras pautas”, conclui Pedro Berto.


O Fala Roça procurou a Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro e o Ministério da Saúde. Até o momento, só o Ministério da Saúde respondeu nossas solicitações.


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