Museu resgata a história da Rocinha
Um pássaro com as patas plantadas para frente e com a cabeça virada para trás olhando para o passado. Esse é o significado de Sankofa, uma ave mitológica do país de Gana, que dá nome ao Museu Sankofa de História e Memória da Rocinha. O projeto tem o objetivo de resgatar a memória da favela, mas sem deixar de pensar no futuro. A ideia de museu surgiu há seis anos, mas esse trabalho existe desde a década de 1970.
O grupo que faz esse resgate é composto por sete integrantes, todos moradores da Rocinha. A principal ferramenta de pesquisa é o próprio morador, que pode enviar fotos e documentos, que depois de digitalizados, voltam para ele. Outra forma de preservar a memória coletiva ocorre por meio de histórias contadas oralmente por moradores mais antigos. O museu possui um blog na internet, abastecido com textos sobre a Rocinha e com as informações dos eventos do projeto. Para o historiador Fernando Ermiro, um dos fundadores do museu, esse resgate é importante porque dá a todos o direito de conhecer o seu passado.
“É uma questão de direito. A pessoa tem o direito à memória, ela tem o direito à cultura, ela tem o direito ao seu dizer, direito à sua oralidade, mas não é que a memória esteja ligada ao território, ela está ligada àqueles moradores que lá estiveram, aqueles moradores que lá estão. Eles têm um orgulho de contar a sua própria história.”, explica Fernando.
O museu, que ainda não tem sede fixa, está trabalhando junto à Prefeitura do Rio de Janeiro para conseguir um dos terrenos que estão sendo desapropriados no Laboriaux, na parte alta da Rocinha. O intuito é que o local guarde o acervo de aproximadamente 2.000 peças e que sirva como um local de referência. Porém, mesmo com uma possível sede, o intuito é que o museu seja de percurso.
“A nossa ideia é que o acervo seja a casa do próprio morador. Você forma uma parceria para que ele abra a casa para exposição ou uma parte da casa para contar um pedaço da história da Rocinha. É possivel que em cada localidade tenha um morador para ajudar nesse trabalho.”, conta Ermiro.
O historiador conta que o serviço feito não á patrocinado e que todos os recursos captados vêm de editais públicos de orgãos do Governo. Para manter o sonho vivo, o projeto também conta com a ajuda de parceiros, como: Laboratório de Educação e Patrimônio Cultural (LABOEP), da Universidade Federal Fluminense (UFF); Instituto Moreira Salles; C4 Biblioteca Parque da Rocinha; Quadra da Acadêmicos da Rocinha e das escolas municipais locais.
Recentemente, o grupo organizou a exposição “Ambulantes – Ontem e Hoje”, que está aberta para visitação na C4 Biblioteca Parque da Rocinha até o fim de julho. O trabalho surgiu com a vontade de celebrar o dia do trabalhador com os moradores e foi concebido após uma releitura das fotos de ambulantes feitas pelo fotógrafo Marc Ferrez, em 1989, na cidade do Rio de Janeiro. Os registros fotógraficos da época serviram como base para as novas fotos com os vendedores de rua da Rocinha.
O jornalista e fotógrafo Flávio Carvalho, que trabalha na C4 Biblioteca Parque e fez as fotos da exposição, disse que recebeu esse convite com muita alegria. Poder contar a história dos ambulantes, e também a do seu pai, foi importante, porque deu visibilidade a eles.
“Eu achei muito interessante poder fazer isso pelo meu pai, para contar um pouco da historia dele, que faz parte desse projeto. Eu queria valorizar esses comerciantes. Acho muito bonito a gente tentar fazer uma divulgação do trabalho dessas pessoas. Fazer com que as pessoas parem para ver, por exemplo, o quanto de comerciante tem ali no Boiadeiro.”, conta Flavio.
Os integrantes do grupo Museu Sankofa de História e Memória da Rocinha já planejam os próximos eventos. Ainda este ano acontecerá um “Chá de Museu”, uma tarde em que as pessoas podem trazer objetos, conversar e trocar informações sobre o passado da Rocinha. A intenção do grupo é que o evento ocorra a cada três meses. Outro plano é promover o Memória Feminina em Três Tempos, com as mulheres de ontem, de hoje de amanhã, para que elas possam contar suas próprias histórias, a partir do ponto de vista feminino.
O projeto é aberto para qualquer pessoa que queira participar como organizador ou para quem quer oferecer documentos, fotos ou objetos que contribuam para resgatar a memória coletiva da Rocinha.