De volta para minha terra

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Muitas vezes, viajar de avião é mais barato do que viajar de ônibus. Desde 2011, as classes C e D impulsionaram o mercado de turismo no Brasil com a ampliação do crédito. O nordeste brasileiro é um dos principais destinos nacionais, entretanto, a viagem da moradora Josita Maria da Silva, de 62 anos, foi por um motivo diferente. Ela visitou os familiares após 30 anos longe da terral natal, na Paraíba.

Criada na roça, a paraibana nasceu em Boqueirão, uma cidade do interior paraibano. Ela veio para o Rio de Janeiro na metade dos anos 80 após a morte da mãe. O convívio com o pai não era bom porque ele havia se relacionado com uma mulher que ela não gostava. Antes de vir para o Rio, ela trabalhou durante oito anos como professora de artes em uma escola municipal na própria cidade. “Eu fazia bordado a mão, tapeçaria e artesanatos em geral. Era muito bom, mas eu pedi demissão e decidi vir para o Rio”, lembra ela.

Assim que chegou no Rio, ela foi morar em Copacabana na casa de uma prima que trabalhava em um prédio. Em pouco tempo, a prima conseguiu um emprego para Josita como doméstica em Ipanema. A patroa cedeu um quarto para ela e nos dias de folgas, ela ia para a casa da prima. Os passeios que ela fazia na Praça General Osório, em Ipanema, fez com ela conhecesse o futuro marido. “Estava na Praça General Osório com a minha amiga e ele chegou perto de mim. Começamos a conversar e ele disse que procurava um relacionamento. Era bom de papo. Minha patroa criticava ele porque andava desarrumado. Existia muita fofoca na época”, conta ela que é casada há 25 anos com Paulo Afonso, de 64 anos, natural de Rio Pomba, em Minas Gerais.

Após três anos de namoro, Josita e Paulo decidiram alugar uma casa na Glória, atrás do prédio da extinta revista Manchete. “Estávamos morando há oito meses na Glória e engravidei dele. Eu perdi o emprego por conta da gravidez e ele ganhou uma pequena casa no playground do prédio em que ele trabalhava na Avenida Vieira Souto, em Ipanema, aí fomos morar lá”, explica ela.

Seu marido trabalhava como porteiro e ela tinha que ficar em casa porque precisava cuidar da filha. A primeira gravidez ia bem até que veio a notícia de que estava grávida pela segunda vez, em 1989. “ E eu ainda amamentava a Michele. Eu fiquei muito nervosa quando soube da segunda gravidez”, diz ela.

Mãe de duas meninas aos 32 anos de idade, desempregada e morando em Ipanema, um dos bairros mais chiques do Rio, Josita viu a situação da família se agravar com a demissão do marido do prédio em Ipanema. “Meu marido teve problemas no trabalho e tivemos que nos mudar para o Laboriaux, em 1992, por indicação do filho de uma moradora do prédio. Ele disse que a Rocinha era um bom lugar para morar. Os irmãos do meu marido se juntaram e construíram uma casa de madeira pra nós”. Meses depois de se mudar para o ponto mais alto da Rocinha, ela engravidou novamente. “Quando engravidei do terceiro filho, foi um dos momentos mais difíceis na minha vida porque eu e meu marido estávamos desempregados”, lembra ela.

Depois de um viver um período conturbado na casa em que vivia no Laboriaux, Josita e Paulo venderam o imóvel e alugaram um porão na Praça do Skate, na Curva do S. “Era muito ruim porque a gente não podia ficar em pé dentro de casa. Tinha que andar agachado”, relembra.

Na metade dos anos 90, seu marido recebeu um dinheiro de uma rescisão contratual de um trabalho e compraram uma casa na parte alta da Vila Verde por indicação de uma amiga. “A casa era boa, naquela época tinha muito mato e a ladeira era de barro. Depois eu me arrependi porque o dinheiro que ele tinha recebido dava para comprar uma casa na parte baixa da Rocinha”, explica.

Dona Josita posa na laje da casa onde mora na Vila Verde. (Foto: Michel Silva)
Dona Josita posa na laje da casa onde mora na Vila Verde. (Foto: Michel Silva)

Desde que ela veio para o Rio, não havia visitado nenhuma vez os familiares na Paraíba. A família dela pensava que ela não queria mais contato com eles porque enviavam cartas para ela e não recebiam respostas. Porém, um primo de Josita morava na Glória e tinha telefone. Quando podia visitar o primo, ela ligava para as irmãs que esperavam ansiosamente por notícias.

Os trabalhos que ela fazia como empregada doméstica e faxineira não geravam uma renda suficiente para viajar. Além disso, os filhos precisavam estudar. Depois de crescidos, os filhos resolveram recompensar a mãe por toda a dedicação e organizaram a viagem dela para a Paraíba através da internet. “Ela ficou muito preocupada sobre como as pessoas iam falar da aparência. De repente por tudo que ela passou no Rio de Janeiro e os familiares sabiam da dificuldade que ela teve quando éramos crianças”, conta Monique Silva, 24 anos, uma das filhas de Josita.

A viagem aconteceu no início de 2015 junto com seu marido. Foi a primeira vez que ela viajou de avião. “Eu nunca tinha visto um aeroporto. Foi tudo muito novo. Quando vim para o Rio, foi uma viagem de três dias em um ônibus. A viagem de avião foi menos de duas horas. Quando o avião decolou, eu pedi ajuda para Jesus abençoar a viagem”, conta ela.

A paraibana que veio para o Rio iniciar uma nova vida voltava para a cidade em que nasceu para reviver a velha vida na roça. “Quando cheguei em Boqueirão, foi uma alegria muito grande. Minhas irmãs me buscaram no aeroporto e fomos embora de carro para casa. Chegamos em casa às 2h e todo mundo estava acordado. Meus familiares soltaram fogos de artifício comemorando a minha chegada na cidade”, lembra ela.

De volta ao Rio, ela já faz planos para a próxima viagem. “Antes de voltar eu prometi para as minhas irmãs que iria retorna à Boqueirão todo ano. Na próxima viagem quero levar meu filho mais novo”, conta ela com um sorriso no rosto e segurando um celular que comprou para manter contato com os familiares.

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