Cine debate integra usuários do CAPS e moradores na Rocinha

Atividade mensal desconstrói estigmas sobre transtornos mentais, promovendo diálogo e informação para a população local
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“Queria que o meu irmão tivesse tido a oportunidade de acessar um serviço de qualidade como estou tendo nessa oficina. Faz 22 anos desde que ele faleceu.” A fala é de Blandina Neder, 64, usuária do CAPS (Centro de Atenção Psicossocial) III Maria do Socorro, na Rocinha. Assim como ela, outros usuários da unidade e moradores participam da oficina de cine debate mensal na redação do Fala Roça.

O evento ocorre toda segunda quinta-feira do mês e promove a integração dos assistidos à cultura, diálogo e lazer. Desde julho, o cine debate é realizado na sede do Fala Roça a tarde, devido às obras no CAPS III, localizado na Curva do S. A iniciativa é uma colaboração do CAPS III e do Fala Roça. 

Já foram concluídas três sessões com direito à pipoca e refrigerante. Filmes como Holocausto Brasileiro e Divertidamente e Viva: a vida é uma festa já foram reproduzidos nas sessões mensais. Cada oficina dura em torno de duas horas e os participantes após assistirem ao filme, compartilham opiniões e experiências. 

Para Blandina, usuária do CAPS há um ano e quatro meses, o cine debate é um momento de reflexão e emoção coletiva. Participante desde a primeira amostra de filme, ela expressou o impacto da oficina na sua vida e a qualidade do serviço fornecido pelos profissionais do CAPS.

“Sempre me tratei de forma particular e o CAPS entrou na minha vida há um ano e quatro meses. Percebi que esse movimento plural que existe dentro dos CAPS é importante para conseguir equilibrar suas emoções e fazer um tratamento. Participo de todas as atividades que o CAPS oferece! É só participando que a gente [usuário] vai poder colher os frutos dos benefícios que essas atividades fazem”, disse.

Após a dinâmica de debate, que destacou a campanha Setembro Amarelo, a assistida desabafou com os colegas. Expressou que queria o irmão vivo para acessar serviços de saúde como a oficina de cine debate. “Esse filme [Viva: a vida é uma festa] me fez relembrar a dor da perda de um irmão. Sinto ele [seu irmão] presente o tempo inteiro na minha vida. Queria que o meu irmão, que cometeu suicídio há 22 anos, estivesse aqui para ter acesso a um serviço de qualidade como estou tendo nessa oficina.”

Usuários do CAPS participam de cine debate. Foto: Karen Fontoura

Em 2022, a OMS (Organização Mundial da Saúde) divulgou uma revisão mundial sobre a saúde mental das pessoas. O relatório recomenda valorizar a saúde mental e intensificar ações concretas para quem tem transtornos mentais, como programas de aprendizagem social e emocional.

Maria Rejane Pereira, 25, psicóloga e oficineira do CAPS III, afirma que atividades externas como o cine debate são essenciais para desenvolver o lado psíquico e social dos usuários. A profissional explicou o objetivo do projeto e o impacto na vida dos participantes, em média de 10 a 15 pessoas.

“Trabalhamos com a ideia de que o sujeito esteja no [meio] social. Tentamos fazer o máximo de atividades externas para que a gente possa levar o sujeito para a cidade, para ocupar espaços e direitos que são vezes negados. Eles [usuários] conseguem trazer as vivências pessoais, a vivência do outro e interligar. É muito rico por conta dessa dinâmica de grupo”, esclareceu.

E reitera que o cine debate na redação do Fala Roça desconstrói estigmas sobre pessoas com transtornos mentais e traz a população local para dialogar ou ficar informada. “A ideia quando a gente começou o cineclube no Fala Roça foi de trazer a comunidade para interagir com essas pessoas. É uma dificuldade porque é muito estigmatizado, ainda tem muito preconceito, mas é muito rico quando eles se encontram.”

Gabriel Carvalho, 23, é assistido pelo CAPS e participa todo mês do cine debate. O jovem ressaltou que a oficina é uma oportunidade para os usuários compartilharem sentimentos e socializar sobre temáticas importantes.

“É uma ótima oportunidade para o paciente se expressar, ter experiências com as emoções, com sentimentos, conseguir entender e ter a cognição do que está sendo passado no filme. É muito terapêutico, me sinto num espaço de lazer!”, comentou.

E complementa ao compartilhar que o cine debate proporciona cultura e chance de construir novas amizades. “Gosto muito de filmes, de estar perto dos meus amigos que fiz aqui [no cine clube], me soma e acrescenta muito. Aqui é o momento que a gente tem de interagir um com o outro, de nos conhecermos mais.”

O cine debate acontece toda segunda quinta-feira do mês, à tarde, na sede do Fala Roça. O endereço é na Estrada da Gávea, 558, entrada pela rampa do Trampolim. A iniciativa é aberta e gratuita para usuários do CAPS e moradores de favelas.

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