Educação construtivista ganha espaço em creche da Rocinha
Método de ensino é empregado no país desde os anos 1980 e propõe autonomia do aluno
“Hoje a criança é a principal parte da educação. Você trabalha com a criança a partir do conhecimento que ela traz de casa. Não construímos o seu conhecimento, mas nós enriquecemos aquilo que ela já tem”, explica Maria Cristina Vieira, 71 anos, diretora adjunta da Creche Municipal Iacyra Frazão, localizada no Laboriaux, na parte alta da Rocinha.
A abordagem pedagógica da educação construtivista, método de ensino empregado no país desde 1980, visa trabalhar com autonomia da criança como centro da aprendizagem. “A escola oferece condições para desenvolver o que a criança precisa através da leitura, da escrita e das brincadeiras”, conta a pedagoga Maria Cristina, com 48 anos de profissão.
As creches têm um papel fundamental na idade da primeira infância, pois é o primeiro contato das crianças com a dinâmica escolar. Há diferentes métodos de ensino para o desenvolvimento dos pequenos, sendo uma delas a educação construtivista.
“Respeitamos a individualidade [de cada criança], porque são seres diferentes de pais diferentes e educação [também é] diferente. Com isso, precisamos fazer um trabalho que atenda todo mundo dentro das suas especificidades, entender suas necessidades” ressalta Maria Cristina, de 71 anos.
A Creche Municipal Iacyra Frazão atua desde 2010 na Rocinha, por exemplo, trabalha com 40 crianças em duas salas da unidade, que tem ainda um pátio interno com estante de livros e brinquedos à disposição para as crianças brincarem e interagirem na hora do recreio.
“O principal é oferecer para essa criança uma educação de qualidade para que ela te dê o retorno que você quer”, pondera a pedagoga da unidade.
Mas, o que é o construtivismo?
Na prática, não existe um método seguido à risca na educação construtivista que se compare ao modelo do ensino tradicional que, geralmente, tem o ensino centrado na figura do professor e onde o papel do aluno é de espectador. As atividades em creches construtivistas surgem pelas necessidades da criança. Por exemplo, como a introdução de diversos tipos de alimentos.
“Aqui na creche temos uma dificuldade muito grande que é introduzir novos alimentos como o macarrão. As crianças estão acostumadas a comer espaguete e aqui fazemos diferentes tipos de massa [parafuso, talharim, gravatinha], logo, as crianças estranharam. Então, a professora faz uma atividade conjunta apresentando outros tipos de macarrão”, conta a diretora adjunta da creche Iacyra Frazão.
Durante as atividades são oferecidos também diferentes estímulos explicando as atividades. Foi o que aconteceu quando a creche levou o cozinheiro Kevin Rodrigues, de 20 anos, um colaborador da unidade, para ser entrevistado pelas crianças sobre alimentação saudável.
Nas salas de aula da Creche Iacyra Frazão, as mesas são redondas, para haver uma interação grupal entre os alunos e promover trabalho em equipe durante as atividades. Durante a visita à escola, os trabalhos elaborados pelas crianças ficam expostos nas paredes, dá para notar que algumas atividades se mantêm ao longo do tempo, como plantar feijão no algodão.
“A gente só faz esse trabalho, graças a parceria que a gente tem com os professores. Com o engajamento deles no trabalho que realizamos aqui na creche. Sem eles, [nada] disso seria possível”, opina Maria Cristina.
Trabalho em conjunto entre creche e família
As atividades propostas são feitas para irem para além dos muros da creche, sendo uma extensão do conhecimento para dentro de casa. “A gente tenta que os pais trabalhem com as crianças em casa. Aqui temos o projeto leitura em família”, destaca Maria Cristina.
Segundo a diretora adjunta, uma sacola de 15 em 15 dias, percorre a casa de uma família para estimular a leitura entre pais e filhos. “A gente coloca um livro para o pai contar a história para o filho no final de semana e, pedimos para conversar com a criança sobre o livro”, afirma a pedagoga.
O contato dos pais com a escola é considerado “positivo” pela equipe, mas eles ressaltam que enfrentam alguns desafios: como a dificuldade de presença em reuniões, já que muitos trabalham. Porém, a pior barreira às vezes é a realidade da desigualdade educacional, pois alguns responsáveis não sabem ler.
“A gente tem pai [responsáveis] que não sabem ler e nem escrever. Você descobre isso quando manda um recado e ela fala assim para você: ‘pode mandar um áudio?’ Aí, você descobre que para ela é melhor ouvir”, explica Maria Cristina.
Autonomia e desenvolvimento
De acordo com a Base Nacional Comum Curricular( BNCC), a primeira etapa da educação infantil devem ser garantidos seis direitos de aprendizagem, sendo eles: conviver, brincar, participar, se expressar, explorar e conhecer-se, para que as crianças tenham condições de aprender e se desenvolver.
“Neste semestre, a escolha do projeto foi feita pelas próprias crianças”, conta Karoline Gama, de 25 anos, pedagoga da educação infantil de uma escola privada. Ela percebeu, como professora, o quanto as crianças estão encantadas com os contos clássicos. “[Elas] se fantasiam e encenam histórias tanto sozinhas quanto com os amigos no pátio”.
Para ela, a abordagem construtivista dá resultados para autonomia das crianças. “Na sala de aula percebo o quão bom e importante é dar voz às crianças e permitir que elas sigam e explorem sua própria virtude, que é a curiosidade e o encantamento”, exemplifica Karoline Gama.