Extinção de equipes inteiras do PSF, redução no número de Agentes Comunitários de Saúde (ACS) por equipes, cortes de verbas de custeio, salários congelados e atrasados; falta de manutenção e de reposição de equipamentos, medicamentos  e insumos, além da possibilidade de queda no número de médicos e enfermeiros residentes na atenção básica. Esse é o dramático quadro enfrentado pelo Programa Estratégia Saúde da Família no município do Rio de Janeiro na atual administração municipal.

Os profissionais do setor – médicos, enfermeiros, técnicos e Agentes Comunitários de Saúde (ACS) – entraram em greve desde o início deste mês de novembro por conta da falta de condições de trabalho. Além de não estarem recebendo seus salários em dia, os profissionais não contam com a infraestrutura necessária para exercerem um atendimento condizente com as necessidades da população. Nas clínicas da família e postos de saúde a internet é precária, os computadores são obsoletos e não são substituídos quando apresentam defeito.

Dessa forma, a  Atenção Básica à Saúde, cuja mola mestra é o Programa Estratégia Saúde da Família (PSF), está com seus dias contados no Município do Rio de Janeiro, pelo menos no que depender da vontade da atual administração comandada pelo bispo licenciado da Igreja Universal do Reino de Deus e ex-senador, Marcelo Crivella. Os problemas, que começaram desde que assumiu o cargo em 1º de janeiro de 2017, vem se acumulando dia a dia com os constantes cortes de verbas destinadas ao custeio da rede pública de saúde.

Lamentavelmente, hoje, o tema sucateamento da saúde está na pauta do dia do noticiário das empresas de comunicação e não se refere apenas ao PSF, mas a toda a rede pública de saúde mantida pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

O que se vê por toda a cidade são reclamações de pessoas que buscam atendimento nos hospitais públicos, postos de saúde e Clínicas da Família, a maioria desses estabelecimentos administrados por Organizações de Saúde, mais conhecidas como OS. Grande parte dessas terceirizadoras de mão de obra contratadas na administração passada não tiveram seus contratos renovados pela atual gestão como deveria ser.

Exemplo de Saúde Pública – Clínica da Família Maria do Socorro é exemplo de Saúde Pública em território popular. (Foto: Reprodução/CFMSSS )

Sob o pretexto de reestruturar a Atenção Básica à Saúde, o prefeito Crivella anunciou, já em 2017, o corte de 239 equipes de saúde da família fato que levaria a redução de aproximadamente 1400 postos de trabalho no setor. De lá para cá as demissões vem ocorrendo paulatinamente atingindo médicos, enfermeiros, técnicos de enfermagem, técnicos de saúde bucal, administrativos, e, principalmente Agentes Comunitários de Saúde (ACS), estes últimos responsáveis pela aproximação das comunidades com as equipes de saúde da família. 

Os ACS fazem o cadastramento residencial dos usuários, promovem ações educativas de saúde nos territórios, fazem o acompanhamento de hipertensos, diabéticos e de pessoas acometidas de tuberculose e hanseníase. Eles também  acompanham as gestantes durante todo o período da gravidez e pós-parto.

As crianças são acompanhadas desde o nascimento até os cinco anos de idade, com especial atenção a atualização vacinal. As que estão com histórico de vacinas atrasado são logo procuradas em casa e os pais alertados sobre a importância de se manter a caderneta atualizada. Essa vigilância é constante.

Com a redução das equipes do PSF e  do quadro de profissionais nas equipes que sobrarem a qualidade desse importante programa de saúde pública fica comprometida. A economia feita pela prefeitura, que começa pelo sucateamento de equipamentos e pela degradação das instalações físicas das unidades de saúde, trará, já a médio prazo, a volta dos altos índices de mortalidade infantil, o aumento da mortalidade de pessoas hipertensas e diabéticas e o recrudescimento dos casos de hanseníase e tuberculose. A economia que se faz agora pode sair bem cara num futuro bem próximo.

Na principal clínica da Família da Rocinha, a Clínica Maria do Socorro Silva e Souza (CFMSSS), na Zona Sul da cidade, hoje responsável pela residência médica e de enfermagem de profissionais que desejam se especializar em Saúde da Família e Comunidade, os reflexos dos cortes promovidos pela prefeitura já começam a aparecer. A partir de 2020 é possível que haja uma substancial redução no número de residentes interessados em participar dessa espacialização nessa unidade.

É que o município já anunciou uma diminuição de aproximadamente  40 % valor da bolsa de estudo, cuja verba vem do governo federal. Desse percentual, o que vem dos cofres do município é mínimo, algo em torno dos 3%. Mesmo assim, o prefeito resolveu mexer nesse importante curso de especialização.

O quadro está se agravando. Na Rocinha, a Clínica da Família Maria do Socorro Silva e Souza já perdeu uma das suas 11 equipes do PSF. Os pacientes dessa região da favela – a  Fundação – foram redistribuídos entre outras equipes, que também sofreram redução no quadro da Agentes Comunitários de Saúde. Cada equipe, que no início do PESF, contava com 06 ACS agora conta com apenas quatro, o que compromete a perfeita cobertura desse imenso território. 

Se depender na Programa Nacional de Atenção Básica (PNAB 2017), a quantidade de profissionais por equipe pode cair ainda mais. Esse programa controlado pelo MS permite que as equipes funcionem com apenas um ACS ou até sem esses profissionais, se assim o gestor municipal desejar. Caso isso aconteça, o PSF deixará de existir oficialmente, pois as clínicas da família serão transformadas em meros postos de saúde.

Sobre o autor: Eraldo Silva é natural de Campina Grande, Paraíba, e formou-se em Comunicação Social, habilitação em jornalismo, em 1992, pela Universidade Estadual da Paraíba. Repórter experiente, já trabalhou em rádios, jornais e com assessoria de imprensa durante campanhas eleitorais. Atualmente mora no Rio de Janeiro, onde é Agente Comunitário de Saúde na Clínica da Família Maria do Socorro, na Rocinha.


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