Um misto de expectativas, tensão e dúvidas marcaram a reunião de apresentação do programa Comunidade Cidade, do governo do estado. O encontro reuniu, nesta terça-feira (3/09), cerca de 250 moradores, lideranças comunitárias e agentes de órgãos públicos em uma igreja batista, no Valão, parte baixa da Rocinha.

O investimento na urbanização da Rocinha será mais de R$ 1,5 bilhão para obras de saneamento, mobilidade, habitação, resíduos sólidos e equipamentos urbanos. O último censo feito pelo PAC Social aponta que existem cerca de 101 mil habitantes na Rocinha. Os técnicos do Comunidade Cidade projetam que entre os anos de 2009 e 2019, a população tenha aumentado para 120 mil moradores. 

Ruth Jurberg, coordenadora do Comunidade Cidade, comandou a apresentação. Ela também trabalhou nas obras do PAC 1 e 2, do governo federal, que não foram concluídas. Com olhares atentos e moradores falando entre si, o som das caixas não contemplou a todos que foram até o local para escutar as propostas do programa.

Cerca de 7 mil famílias da Rocinha serão realocadas por causa das obras. Segundo Ruth Jurberg, foram identificadas 18 áreas onde novos apartamentos poderão ser construídos. “Podem ser 15, 17, podem ser 20. Muitos de vocês vão poder nos ajudar também dizendo: “Olha, esse terreno aqui pode ser negociado”. Nenhuma família será removida da Vila Cruzado e atrás do Complexo Esportivo da Rocinha.

A maioria dos terrenos onde os prédios serão erguidos estão localizados próximos à Estrada da Gávea e já estão numerados. Veja abaixo a lista de edificações:

  • Edificação 01, atrás do CIEP 303 Ayrton Senna da Silva
  • Edificação 02, no antigo terreno da Telerj/Telemar
  • Edificação 03, em frente ao Clube Emoções
  • Edificação 04, 05 e 06, na Estrada da Gávea, n° 527
  • Edificação 07 e 08, na Estrada da Gávea, S/N
  • Edificação 09, na Estrada da Gávea, n° 457
  • Edificação 10, próximo ao Umuarama
  • Edificação 11, na Rua 1
  • Edificação 12, na Rua da Raiz
  • Edificação 13, no Bairro Barcelos
  • Edificação 14, no Costão
  • Edificação 15, entre Cachopa e Dionéia
  • Edificação 16, próximo a UPA da Curva do “S”
  • Edificação 17, na Estrada da Gávea, n° 306
  • Edificação 18, na Estrada da Gávea, n° 140

Na legislação municipal, só é permitido construir prédios verticais com quatro andares. O governo vai sugerir mudanças na lei para poder construir prédios com mais altos. Com a mudança, a estimativa é oferecer 2.400 habitações. As famílias que optarem pelo apartamento vão receber o aluguel social todos os meses, após a liberação das antigas residências que estão na rota das obras. “A família que for afetada pela obra diretamente vai poder escolher. Se ela quer o apartamento e ela vai receber o aluguel, ou se ela quer comprar um outro imóvel, morar aqui dentro ou sair da comunidade. É uma decisão de cada família”, afirmou Ruth Jurberg.

Som baixo, lugar abafado e horário incomum foram problemas apontados pelos moradores. (Foto: Michel Silva/Fala Roça)

O Plano Diretor da Rocinha, produzido pela equipe do arquiteto Luiz Carlos Toledo, foi lançado em 2008. O documento previa melhorias para a Rocinha nos últimos 15 anos. A expectativa é de que os projetos que ficaram no papel sirvam como um norte para outras obras no morro.

Saneamento

As obras vão começar pela Vila Cruzado, na parte alta da Rocinha. Lá é onde está o reservatório do Navio, o receptor que distribui água para o morro. Com capacidade para sete compartimentos, somente um compartimento está em funcionamento. Uma obra de recuperação dos outros seis compartimentos deverá normalizar o abastecimento de água, segundo Ruth Jurberg.

Os talvegues por onde as águas da chuva e o esgoto passam vão receber obras de drenagem que serão conectadas ao sistema de tratamento em São Conrado. Por isso, a necessidade de remover as casas que estão nos traçados das obras. “Às vezes o lixo não consegue passar, acaba entrando esgoto para dentro da casa do morador. Isso precisa ser resolvido, não em uma ou duas valas, mas nos principais talvegues que são essas grandes valas que contribuem aqui na Rocinha”, conta Jurberg.

Um levantamento feito pelo programa mostrou que existem 48 pontos irregulares de despejo de lixo contra 11 pontos regulares. A proposta é trabalhar projetos de reciclagem para evitar que os moradores joguem lixo nas valas. Um polo de reciclagem será erguido na Roupa Suja, possivelmente, em cima do Túnel Zuzu Angel.

Novas vias

A abertura de ruas têm origem no Plano Diretor. A via Binário vai começar na Curva do “S”, vai passar por trás do CIEP Doutor Bento Rubião, cortando o Largo da Vila Verde e terminando próximo ao Escadão da Vila Verde conectando com a Estrada da Gávea.

Os traçados originais das Ruas 1, 2 e 3, de 1930, também serão executadas. A Rua 1 vai receber uma rua que ligará a parte alta do morro passando pela encosta do Morro Dois Irmãos em direção a Roupa Suja. Já a Rua 2 será conectada com a Rua do Canal (Rua do Valão). Um parque linear será construído da Rua do Valão até a Rua 2. E a Rua 3 vai ser aberta conectando a Rua 2, na altura do Largo da Rua 2 com a Estrada da Gávea.

A Rua da Raia, na Cachopa, vai ser alargada podendo ser conectada com a Rua da Fonte, na Vila Verde.

“Outra coisa é viabilizar o ordenamento viário. Às vezes você sobe a Estrada da Gávea é uma loucura. É moto cruzando de um lado para o outro, estacionamento de um lado para o outro. Realmente tem que ser muito bom de direção para poder subir quando a Estrada da Gávea não para porque não tem como subir um ônibus ou descer o outro”, enfatizou Ruth Jurberg enquanto uma moradora disse: “Agora ela falou o português claro”.

As localidades Dionéia, 199 e Roupa Suja terão planos inclinados, similares ao que existem no morro do Cantagalo e no morro Dona Marta, ambos na zona sul do Rio.

O plano inclinado da Dionéia começará na parte alta da rampa da Cachopa até o alto da Dionéia em direção ao Parque Ecológico, que ganhará uma reforma. O plano inclinado da Roupa Suja, abandonado na época do PAC, ligará a parte baixa da localidade com a parte alta. O plano inclinado do 199 será o mais longo de todos. Ele começa na Rua 1, passa pela Vila Vermelha/Terreirão, desce pelo 199 até o Umuarama.

Ruth Jurberg (com microfone na mão) com a lista de obras no telão. (Foto: Michel Silva/Fala Roça)
O tal boulevard

A polêmica começou com o governador Witzel afirmando que a Rocinha receberia um boulevard. Nesse tipo de construção é feito uma rua larga, arborizada com comércios nas proximidades. De acordo com o projeto, o boulevard está sendo estudado e será feito na parte baixa do morro junto com a Rua do Canal. Nem todos os projetos de obras estão detalhados, pois demanda tempo para serem concluídos.

O Comunidade Cidade prevê a reurbanização do Largo do Boiadeiro, a Praça da UPA, o Parque Ecológico e a Praça da Cachopa. A Quadra da Rua 1 dará lugar a uma escola técnica. A região do Umuarama vai ganhar uma praça. 

Dois mercadões populares serão construídos. Um na Rua do Canal e outro na Estrada da Gávea, próximo a Rua 1.

Educação

12 creches comunitárias vão ser reformadas. 4 creches serão construídas nas seguintes regiões: em frente ao Clube Emoções; na Vila Verde; na Dionéia e a última que ainda não possui localização.

Duas parcerias internacionais vão apoiar os investimentos na área educacional. O Google e a ONU-Habitat. O Google vai oferecer ferramentas tecnológicas para professores e alunos em uma nova forma de estudo dentro e fora da sala de aula.

Muitas dúvidas no ar

Moradores tiveram a oportunidade de fazer perguntas. Mas enfrentaram o rígido controle da organização e sons de vaias e gritos. Um morador sugeriu a criação de uma comissão de moradores para fiscalizar os gastos das obras. Ele foi interrompido por Ruth Jurberg e recebeu vaias de moradores. 

Outra pessoa questionou se os moradores terão prioridade para trabalhar nas obras. “Vai estar escrito no documento de quem ganhar a obra. Parte da mão de obra precisa ser da comunidade. Vai ter gente de fora? Vai ter gente do Rio. Mas vai priorizar sempre que possível, morador da comunidade”, respondeu Ruth Jurberg.

Uma moradora do Laboriaux relembrou das tragédias provocadas pelas chuvas nos últimos anos. Ela teme que a região fique sem obras, pois as pessoas continuam morando nas áreas de risco. A coordenadora alertou que o plano de intervenção contempla remover e construir casas no Laboriaux, além de ampliar a Rua Maria do Carmo, principal via da localidade. 

O assunto da falta de energia elétrica só entrou na pauta nos minutos finais da reunião após uma moradora denunciar a falta de luz na localidade em que mora. O governo iniciou as conversas com a Light e estão planejando reformas começando pelo Bairro Barcelos e Via Ápia. 

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