Ao andar pela Estrada da Gávea, uma imagem chama atenção: no meio do trânsito caótico da principal via da Rocinha, entre carros, motos, vans e pedestres, um homem desliza com um skate. É Michael Batista, o Mike do Skate, como é chamado na favela. Com 48 anos, ele é uma das figuras mais conhecidas no morro e se orgulha disso.

“Sei que muitas pessoas gostam de mim aqui na comunidade. Eu sou muito grato por isso. Eu desejo o melhor sempre para todo mundo. Sou feliz por ser o Mike do Skate e, por ser tão querido na comunidade onde nasci e fui criado”, revela.

Aos 9 meses de vida, Mike foi diagnosticado com paralisia infantil. À época, a família fez tratamentos médicos, mas sem sucesso, o que agravou a deficiência física. Durante anos, ele tentou usar aparelhos recomendados pelos médicos para se locomover, mas não se adaptou. Foi quando ele viu no skate a saída. 

Mike do Skate posa na Via Apia, na entrada da Rocinha, com seu único skate. Foto: Renato Araujo

“Eu andei com um aparelho parecido com uma cinta de couro. Os médicos disseram que, com o passar do tempo, eu poderia andar de muletas ou normalmente, mas a ‘cinta’ me machucava demais. No verão, esquentava e eu ficava machucado. Tentei usar cadeira de rodas, mas não gostei, até que ganhei um skate. Estou até hoje com ele e não me arrependo. Passei a me locomover na comunidade, me tornei o Michael do Skate”, explica. 

E completa: “Graças a Deus não tenho abatimento por ter essa minha deficiência ou melhor, essa minha eficiência. Deus me capacitou!”.

Skate mil e uma utilidades

Além de facilitar o deslocamento de Mike, o skate também o transformou em atleta. “Já participei de algumas competições. Uma delas contava com 16 atletas e só tinha eu de deficiente. Fiquei em 7º lugar e foi muito gratificante”, conta.

Mototaxistas se acostumaram com Mike descendo e subindo o morro agarrado na traseira das motocicletas. Foto: Renato Araujo

Apesar de adaptado às ruas e vielas da Rocinha, Mike ressalta que, ainda enfrenta dificuldades para circular”. Para ele, a acessibilidade no morro precisa ganhar mais atenção, e não só para pessoas com deficiência. “As calçadas são mal conservadas, faltam rampas e, as que têm, estão em péssimo estado. A quantidade de carros e a desordem são frequentes e não há um respeito com os moradores. Não falo só de quem é deficiente, mas dos idosos, crianças. Tenho sorte porque as pessoas me ajudam quando não consigo andar, sempre tem alguém para me carregar, mas tem gente que não tem”, pondera.  

Mike, aos 27 anos, conseguiu realizar o sonho de ser pai. Ele pensa em criar um projeto para contemplar pessoas com deficiência. “Minha mãe sempre me ajudou durante a vida e me incentivou, ao lado do meu filho, que hoje tem 21 anos. Ele é o meu maior orgulho. Tenho vontade de elaborar algo voltado para pessoas com deficiência, mas para isso acontecer preciso de suporte. Se Deus me permitir e eu tiver essa oportunidade, vou me dedicar ao máximo”, garante.

Essa matéria faz parte da 10° edição impressa do Fala Roça
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