Nada de corpos extremamentes sarados, magros e brancos. Não é esse o modelo de miss “dentro do padrão” de Flávia Souza, de 36 anos. Moradora da Rua 2, parte alta da Rocinha, ela inspira jovens e adolescentes da favela a serem muito mais do que um padrão Gisele Bundchen. A partir do perfil no Instagram, ela mostra como mulheres e homens podem não só amar seus corpos, mas ter uma carreira profissional como modelo plus size. 

Vencedora de seis concursos como Miss Plus Size, a modelo profissional, que é mãe e avó,  conta como se o convite de uma amiga para fazer umas fotos de moda, acabou se tornando o sonho da vida. “Não quero parar somente nessas faixas. Quero ganhar a faixa [miss beleza plus size] do concurso estadual, a do bairro, a nacional e outras”, afirma.  

Para ela, participar de concursos plus size “é quase uma terapia”. “É o meu momento. Me sinto muito bem nesse lugar. Demorei a me encontrar, mas depois que tive a primeira oportunidade, ninguém conseguiu mais me parar, porque a mulher gorda pode tudo! É não ter vergonha do que você é. A mulher gorda é capaz de fazer tudo e ai de quem falar que não pode”, afirma a modelo plus size. 

Flávia Souza guarda as faixas das premiações recebidas nos últimos anos. Fotos: Osvaldo Lopes

Entre sorrisos largos e frases empoderadas, Flávia conta através do perfil do Instagram um pouco das suas histórias e do dia a dia no morro. Sobretudo, como ela “se apaixonou pela profissão de modelo e o processo de fotografar e desfilar”, tornando-se uma influência para outras mulheres nas redes sociais e dentro da Rocinha.

A da Rocinha revela que, quando foi convidada para estrear como modelo em um concurso de miss, teve apenas três meses de preparação e nunca imaginou sair de lá sendo a vencedora do concurso. Apesar de sonhar em se candidatar de novo já no próximo concurso de miss 2023, que acontecerá neste mês de março, o custo financeiro para participação em cada evento é um obstáculo. 

“Tudo tem um custo [na vida]. Às vezes, pesa [financeiramente] um pouco, mas aos poucos eu vou conseguindo. Neste momento, estou aproveitando minhas faixas e a minha fase de mãe e avó para ficar mais tempo com as minhas crias antes de iniciar o ano letivo”, explica. 

“A vida para uma mulher preta, gordinha e da Rocinha como eu não é fácil, mas eu passo minha boa maquiagem e sigo em frente”, ensina Flávia Souza.  

Musa Evolução

Flávia Souza iniciou carreira e passou a disputar concursos através do projeto social Musa Evolução Plus Size, voltado para mulheres do Rio de Janeiro. O projeto trabalha o  empoderamento feminino e é o primeiro Concurso de Beleza Plus Size a participar do calendário oficial da capital carioca, conforme a Lei 7.616/2022, de autoria da vereadora Laura Carneiro.

O primeiro desfile do modelo profissional foi na lona Cultural Gilberto Gil, atual Areninha, localizada em Realengo. Muito carismática na frente das câmeras, já no começo da carreira, Flavia se destacou na profissão. Mas, não foi só por  conta do carisma. Ela também buscou cursos para melhorar e aprimorar o desempenho. 

“Hoje eu já fiz aulas de passarela, comportamento, moda, posicionamento, fotografia. E, o que mais aparecer, eu faço também. Tudo isso para melhorar minha performance nos concursos e nos trabalhos que faço de divulgação das marcas”, ressalta. 

Ela relata que percebe nas fotografias a evolução dela diante das câmeras e conta sobre cada conquista com orgulho. Além das seis faixas de Miss Plus Size, Flávia também é Embaixadora da Autoestima em São Paulo, Musa do Verão Carioca e participa do Glamour na Favela e Instituto Plus Size Brasil

A modelo profissional conta com apoio da família e amigas para seguir com a carreira, além de uma rede de apoio na Rocinha para conseguir votos em premiações e divulgar ações. Como influenciadora plus size, Flávia Souza, deixa um recado aos jovens da favela: “Todo mundo precisa estudar. Falo isso muito com a minha filha e com os adolescentes. Eu estou voltando a estudar. O lugar do jovem é na escola, aprendendo tudo o que puder”. 

E aconselha: “Temos que estar preparados para a vida, porque quando a oportunidade aparecer, a gente tem que estar capacitado para fazer com qualidade [o trabalho], e assim, ninguém vai poder te tirar dali. Hoje, a internet sendo bem usada, pode proporcionar muita coisa boa”. 

A modelo Plus Size, cria da Rocinha, voltou a estudar e está cursando o 2° ano pelo NEJA, no CIEP 303 Ayrton Senna da Silva.  

Resistência e amor próprio

Mas qual é o objetivo dos concursos de beleza plus size? Muitos concursos como o que acontecerá neste mês de março no Rio de Janeiro, além de revelar talentos, é ajudar mulheres plus size a resgatar a autoestima, combatendo a visão social de que somente pessoas magras podem estar felizes e satisfeitas com a sua auto imagem. 

Afinal, pessoas gordas, especialmente as mulheres, sofrem e convivem desde a infância, passando pela adolescência e até a vida adulta com a pressão estética social que impõe um padrão de beleza.

Longe de ser uma romantização da obesidade, os concursos combatem a gordofobia e ditadura do padrão estético, senso a materialização de uma resistência, encorajamento e empoderamento. Um convite para pessoas de corpos gordos a se amarem e fazerem as pazes com espelho, pois como afirma o Movimento Corpo Livre: “Amar seu corpo é um ato revolucionário”.

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