O Rock in Rio de 2022 foi épico e antológico. Foi uma das melhores coisas que aconteceram nos últimos 10 anos na minha vida. Me chamo Jorge Ricardo Souza dos Santos, mas os moradores me conhecem como Kadinho da Rua 2, no alto da Rocinha. Fui a primeira vez em 1985 com meu pai e minha mãe. Vejam só: há 37 anos. 

Fui criado na Rocinha e nunca tive condições de pagar por um ingresso, mas minha popularidade na favela fez com que eu conseguisse ingresso para ir nas edições de 2011, 2019 e 2022.

Em 2011, eu assisti o show do Metallica. Foi uma viagem ao tempo porque eles tocaram músicas de um disco de 1984. ‘The ecstasy of gold’ e ‘Creeping death’ não ficaram de fora do setlist. Já em 2019 pude assistir a banda inglesa Iron Maiden.

Esse ano eu não estava nem muito animado para ir, mas o evento foi se aproximando. Eu fui vendo aquela energia de gente chegando na cidade. Como sou uma pessoa muito conhecida por causa do Carnaval, botei na rede social falando que eu estava querendo um ingresso, alguém tinha cortesia ou com um preço em conta. Um grande amigo, o Ilha, me ajudou para eu conseguir ir para o festival.

O palco Favela retrata a favela da melhor forma possível e coloca artistas de várias favelas. O palco Sunset é mais misturado. No dia lá no palco Favela, ouvi o show de Sepultura. Nunca tinha presenciado um show do Ratos de Porão. Foi uma banda que segurou a cena de rock punk, aquele rock pesado durante muito tempo. Vi uma parte de cada.

Mas até eu chegar à cidade do rock foi uma saga. Consegui um ingresso aí todo feliz, mas descobri que pra você ir tinha que fazer um cadastro com 24 horas de antecedência, algo assim para o Rock in Rio Expresso que garante a ida e volta de transporte público. Nem consegui dormir direito. Aquela adrenalina em saber qual era o melhor horário para ir e tal. 

Tenho 46 anos e o corpo não está 100% como antes. É diferente quando você tem 20, 25 anos e vai qualquer hora. Fica lá, fica em pé, vai com qualquer tênis. Então tive que fazer uma preparação e botar um gel no joelho, né? Também bebi uma batida de Pau do Índio para ter disposição de curtir até o último minuto.

Sexta-feira. Dia de show do Iron Maiden. Dia de usar preto, né?  Desci a Rocinha às 17h. Todo feliz e rindo de canto a canto da boca. Peguei um ônibus até a estação do BRT, na Barra da Tijuca. 25 minutos para chegar no evento, diferente de um dia comum onde os trabalhadores sofrem para chegar em casa nesse horário.

Andei por todo lugar que você possa imaginar lá dentro. Fui no palco Favela, fui no palco Supernova, fui na Rock Street e brinquei na roda gigante. Tinha um palco de música eletrônica também. Foi tudo lindo, maravilhoso. Muitas famílias, famílias inteiras, pai, mãe, avô, neto, gente de tudo quanto que é parte do mundo. Vi Argentina, Chile, Estados Unidos, Austrália. Uma energia inesquecível. Inesquecível mesmo.

Prestes a fazer 47 anos, já fui pra muito show no Rio de Janeiro. Assisti a Madonna no Maracanã em 2008. Ramones, no antigo Circo Voador, 1994. O Rappa na garagem de ônibus na Rocinha. Eu tinha 19 anos quando assisti o Ramones. Enfim, são muitos shows e solas de sapatos gastados.

Foram 3 anos sem o Rock in Rio, então depois desse tempo adormecidos, as pessoas estão cada vez mais com amor no coração. Querendo se divertir, estão querendo celebrar a vida. 

Uma hora você está no palco Favela, daqui a pouco começa um outro show no Sunset e tem um outro no Supernova. Depois já se apressa porque a primeira banda da noite começa a tocar no palco principal. Foi épico e antológico. Foi o open bar de felicidade. Me senti muito feliz em estar lá.

Penso que o festival pode ser mais acessível criando valores mais atrativos para quem é de favela. Ainda é caro. O palco Favela é um passo importante para fortalecer a cultura da favela. Muitos artistas de favelas que às vezes não tem condições de pagar o valor de um ingresso cheio e foi chamado pra tocar, cantar, dançar. Que nós possamos ter condições de vir aqui em 2024 e fazer parte dessa experiência.

*Jorge Ricardo, colaboração especial para o Fala Roça sob supervisão de Michel Silva

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